Cozinhar tem o poder de provocar-me a perda da noção do tempo. Um bolinho para bater, um ramo de alecrim, uma vulgar pitada de sal e sou facilmente transportada para outras dimensões.
Sinto-me como a criança que brinca sem notar que escureceu, como o velho que joga dominó na praça até que sua véia venha lhe buscar chacoalhando o rolo de macarrão, ou como aquela moça que dança sozinha na festa, de olhos fechados, alheia ao sol que chega e aos poucos viventes que a observam.
Numa espécie de fluxo de consciência, quando tenho por companhia as panelas e colher de pau custo a seguir qualquer linearidade ou procedimento. Não raro me perco nas receitas e quantidades, emimesmada e distraída, ao misturar ingredientes com lembranças-planos-sentimentos.
As conseqüências variam bastante, como o Leitor e a Leitora mais assíduos já puderam acompanhar. Olvido-me de um ingrediente importante, ponho sal duas vezes ou nehhuma, perigo botar fogo no mundo, deito tudo fora e começo outra vez.
Muito embora extraia imenso prazer de abandonar-me à cozinha desse modo assim despretensioso e não-planejado, tendo como intenção nada além de produzir uma refeição simples e acolhedora, hei de admitir que qualquer cozinheiro, por menos sistemático que seja, necessita às vezes cuidar em marcar o tempo de cozimento de algumas coisas.
Ao ver esses dispositivos de cronometrar, com suas sinetas diferentes e formatos tentadores, namorava todos eles e chegava mesmo a escolher um bem lindo, mas relutava – consciente ou inconscientemente – em inserir nos arredores do fogão qualquer objeto que pudesse estorvar meus instantes jamesjoyceanos.
Mas rendi-me toda ao receber, de uma prima querida e astuta, o timer de ovinho que nos observa aí na foto.
De aviso discretíssimo, tem a sineta no volume certo para provocar um despertar tranqüilo sem quebrar o encanto dos devaneios nem fazer queimar o bolo.
Marca de um a 60 minutos, bastando para isso girar seu corpo sobre os sapatos num sentido que ainda não decorei se é horário ou anti-horário.
Tornou-se imediatamente um daqueles utensílios do coração e ocupa agora o posto de Marcador Dadivoso do Tempo – aquele que dizem ser o senhor da razão.
meu fogão tem um timer =)
aliás, parece toque de telefone de filme do Hitchcock
A-DO-REI! rs
O meu timer é de chaleira, mas … AMO esse ovinho, tbm quero! :o)
Bjs
nega, querida.
venho por meio desta convida-la para um jantar anordestinado em minha desfalcada residencia sita à rua tralala numero tralala apartamento tralalá a realizar-se-á em data e horário a definir com os convivas, mas ainda no ano de dois mil e sete. prato principal: lagostas trazidas da terra-pátria.
beijôooo!
esse ovinho eh muito pandego… parece que ele levou um beliscao, ou algo pior! 🙂
bjos,
que lindo esse ovinho! quero um pra mim também! 🙂
Esta carinha…não sei não….
cara escritora
Me encanta a forma como escreves e descreves sentimentos de modo que a leitura torna-se deliciosa e me faz retornar assiduamente ao seu blog. Também gosto de cozinha e de suas receitas, mas, as vezes me pego lendo-o como quem lê um livro de alguém que narra suas memórias. Tão lindo que chamei minhas filhas para que lessem alguns trechos para que, quem sabe, se inspirem a escrever desta mesma forma, com certa leveza e até um pouco de poesia e humor. Parabéns. Admiro também o “querer compartilhar” com os outros o que se sabe. Acho isto lindo.
Olha, também me jogo na cozinha, apesar de não ser uma cozinheira muito sofisticada – especialidade minha são aquelas coisas bem gordas, mineiras…
Se estou chateada, cozinho e fico feliz.